Kaleidoscópio Literário
a expressão de Kathleen Lessa
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          FRAGMENTOS E CISMARES 17
 


                 [DAS TINTAS NOS MEUS DIAS]



                                       "Com o tempo a tinta velha em uma tela muitas vezes se torna transparente. Se isso acontece, é possível ver, em alguns quadros, as linhas originais: uma criança deu lugar a um cachorro e um grande barco não está mais em mar aberto. Isso se chama pentimento, porque o pintor se arrependeu, mudou de idéia".  (Lilian Hellman)

       

               Da palheta, das cores e pintura, amo Van Gogh, que não teve medo de carregar nas tintas, não pôde esconder sua loucura, sucumbiu na lama e na pobreza e renasceu para o mundo, quase um século depois, com suas telas em leilões concorridos, qual uma flor do charco, exuberante e bela, vendida cara nas floriculturas grã-finas.
               Amo igualmente Monet, que mesmo já cego e bonachão, manteve-se poeta no olhar, um olhar de sombras, coloridas e pontilhadas, ora claras e alegres, ora escuras ou suaves, sob o véu do impressionista que revela e esconde, deixando a sugestão em vieses, ver e entrever.
              Amo mais ainda Lautrec, que embora pequenino, feio e doente, mal-quisto e espezinhado, pintava com alegria as paredes e as telas, mostrando o movimento do tempo e dos gestos, o mundo da boêmia, os prostíbulos, desenhos caricaturais, retratando esse escracho embaralhado e difícil a que chamamos vida...que nos surpreende com fausto e pobreza, com feiúra e beleza, mistura de tons fortes e surpreendentes.
              Menciono os três artistas porque em mim habitam todas essas nuances. 
              E quantos mais eu não poderia citar! Envolvo-me na pintura. Sinto-me pintora! O momento, a hora, o dia é que norteiam as formas e  pinceladas com as quais me visto ou me dispo. As cores. O estilo.
             Em mim os sentimentos têm nomes próprios.
Nada de esconder um com nome de outro; nada de guardar o que quero declarar; de fingir aquilo que não sou; de escaramuçar o que sinto. 
Não há rascunho. Sequer arrependimento dos meus sentires. 
O que é  e o que não é  são  expressados com clareza, mesmo que às vezes haja dor ou decepção, de alguma forma, descontentamento...

              Há pintura nos meus dias mas não há pentimento. 



                                      



Tela de Toulouse-Lautrec, "Au Moulin Rouge".
 

KATHLEEN LESSA
Enviado por KATHLEEN LESSA em 20/03/2008
Alterado em 27/06/2012
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