VOLTAR SEM TER
Querer recolher tudo que já se teve,
Inconformada com o que já se foi...
Muitas vezes voltei àquela praia
Em busca dos nossos passos.
Ficaram no espelho do amor,
Junto à espuma das marolas,
Intercalados por nossos nomes,
Escritos com os dedos dos pés
Dentro de um enorme coração na areia.
Eram quentes finais de tarde, janeiro,
No trecho que denominamos Rússia
(Não me lembro mais por quê).
Gaivotas em palraria,
O sol indo embora,
Acenando boas-vindas para a lua.
Momento da passagem dos astros
Que, cúmplices, nos viam passar.
Navios, do horizonte nos espiavam.
Imaginárias pessoas nas escotilhas
Mal entendendo o que era aquela chama
Que, enovelada, se deslocava na areal...
Língua de fogo a crepitar na noite que descia.
Era o Amor com face de gente,
A Paixão feita fogueira ardente,
Mãos nos corpos marulhados,
Desvelo da entrega nos amantes.
Muitas vezes volto àquele pedaço de mar...
Não estás.
Partiste num dos navios estrangeiros.
Escuto tua voz na cava dos búzios,
Procuro teu amor sob as ondas,
Que vão e voltam, rigorosas,
Mas não te devolve aos meus braços...
Aguardo notícias ainda.
Mas marujo sem porto não se lembra de voltar.
SP, 19/4/2005
praia de Tapirema, em Peruíbe (SP)