- por Baudelaire, num debate com um jornalista do "Le Figaro" -
“Se queres ser um jornalista, além do talento e da sensibilidade requerida, é suficiente um vocabulário razoável e uma boa história cotidiana. Mas se queres ser um poeta, além do que já foi dito, que também vale para os rufiões e prostitutas, é preciso saber estar ao lado de Satã e de Deus, é preciso saber domar os ímpetos para ultrajar os costumes, é preciso estômago para engolir o suplício cotidiano, é preciso ser uma criatura imperfeita, tal como o anjo cego da expiação, tal como uma pedra grotesca que esmaga suavemente um jardim florido, mas que sofre uma dor intensa por cada pétala esmagada. Ser poeta é um estar permanente em sintonia entre dois mundos: o do gênio e o do mistificador, mas é preciso tomar gotas diárias de erudição, saber lapidar as duras palavras, torná-las harmônicas, sonoras, evocativas, tudo isso num plano de idéias encadeadas e, sobretudo, ser original. Um poeta que cata as palavras no dicionário parece um recruta à procura de um cartucho na bolsa quando lhe pediram fogo.”
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Fonte: CÂMARA Ruy. Cantos de Outono, o romance da vida de Lautréamont. Rio de Janeiro: Editora Record, 2003.