Persigo o rastro dessa mulher que passa,
Que me arrasta,
Me desgasta,
Me consome,
Pés descalços,
Dedos garras,
Pele áspera,
Olhos doces, doces, doces,
Que me faz escrava,
Corda ao pescoço,
Apertando, sufocando, me vencendo.
Acostumei-me ao cheiro de bolor dessa mulher que passa,
Tão antiga, tão madona,
Que me deforma,
Me soturna,
Me devora,
Tão possessiva, tão ciumenta,
Trançando-me em suas tranças,
Velando-me com sua sombra,
Dama-deusa de negro tirando notas de uma harpa,
Longo acorde em meus ouvidos,
Velho estribilho.
Choro as dores lancinantes dessa mulher que passa,
Que me esvazia,
Que me machuca,
Que me arranha,
Que me enruga,
Que me descarna,
Que passa, passa,
Mas não me deixa!
Olhos tão doces, tão doces, doces,
Vazando lágrimas,
Sangue, veneno.
Deito-me ao colo dessa mulher que passa,
Que passa e fica,
Que é coração de amante,
Que é nódoa,
Que é alma errante,
Que é incômoda
Outra presença
De mim mesma!
Deita em meu colo, velha Senhora...
Porque teu ser sou eu e porque te quero minha!
Não há outra nesta vida.
Não serás o que não és.
Afina tuas cordas,
Abre tua história,
Escreve teu verso,
Ama o melhor que puderes.
Deita e sossega.
Alguém seguirá o teu rastro.
Olho nos olhos dessa mulher que passa,
Olhos tão doces, tão doces, doces...
E não sei qual das duas é a Senhora que renego.